sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

O preço é alto

Depois de ler uma matéria acerca de uma decisão do STJ, de que crianças com idade abaixo de seis anos completos antes de 31 de março não podem ingressar no ensino fundamental, e de verificar questionamentos de mães sobre o impacto desta decisão, comecei a lembrar da minha própria história educacional.

Faço aniversário em maio, no dia 23. Quase três meses depois da idade limite estipulada pelo Conselho Nacional de Educação, ratificada pelo STJ. Aprendi a ler com quatro anos e não cursei a alfabetização. Pulei do “pré”, direto para a primeira série, aos cinco anos de idade. Era o mais novo da turma, realidade que permaneceu até meus 15 anos, quando, em 1995, cursei o 2° ano do Ensino Médio, naquela época, ainda chamado 2º Grau. Nesse ano, fui reprovado e, ao repetir o 2° ano, finalmente estudei com colegas na mesma faixa etária que a minha - "adequados" à turma.

O que posso dizer é que, ao longo da minha vida escolar, sofri muita pressão por ser o "mascote" da turma, que entrava sempre na classe como o "menino prodígio" e assim era obrigado a me portar. Uma nota abaixo de 8,0 era praticamente uma afronta! Lidar com isso durante a infância era até OK. Até porque eu gostava de estudar e era vaidoso o bastante para sentir prazer em mostrar meus conhecimentos. E sobre a adaptação, o que significaria ter um ou dois anos a menos que os colegas, não é?

Mas, ter 12 anos numa turma em que a maioria tinha 13 ou 14 foi brutal e fez um estrago enorme na minha cabeça. Eu ainda era criança no meio de pré-adolescentes. O sentimento de desajuste trouxe uma confusão imensa e um processo de adaptação complicadíssimo. Enquanto os outros falavam em namoricos de escola, eu ainda pensava em gibis da Turma da Mônica e jogos de tabuleiro. Obviamente, era alvo de bullying pelos mais velhos. Sem falar na autoestima completamente prejudicada, já que eu era a companhia desinteressante, com quem ninguém queria andar. Afinal, meus interesses eram apenas os meus e não eram compartilhados por aquela turma de mocinhas e rapazotes, ocupados demais em aprender a lidar com a puberdade. E toda essa confusão mental – como não poderia deixar de ser – refletiu no meu desempenho escolar. De “menino prodígio”, “tornei-me o aluno relapso”, a ponto de reprovar em quatro disciplinas (duas das quais eu amo, frise-se: História e Química). O preço é alto.

A sensação de não pertencimento a nenhum grupo fez o estrago que fez na minha adolescência e isso só começou a se aliviar entre meus 17 e 18 anos, quando comecei a me ajustar um pouco mais, já que comecei a andar com pessoas da mesma idade e com os mesmos interesses. E nesta fase, novamente, as pequenas diferenças de idade realmente passam a ser pequenas, possibilitando o convívio harmônico entre os mais novos e os mais velhos.

Porém, o estrago já havia sido feito, lá atrás, entre os 12 e 14 anos, e “começar” a me adaptar aos 18 significou que, pelo menos, por mais uns cinco anos seguintes ainda havia uma série de conflitos para serem quebrados. O preço é alto.

Portanto, pais e mães que querem incentivar a antecipação da vida escolar de seus filhos, tenham muito cuidado antes de quererem adiantar sua série. Pode até ficar bonitinho no boletim, mas na cabeça da criança, pode gerar linhas ilegíveis e cálculos com resultados que nunca batem. E o preço disto? Ah, é alto. Muito alto.

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