sexta-feira, 23 de abril de 2010

Solidão dói

(originalmente publicado em)
Valença, sábado, 27 de janeiro de 2007

Hoje li um livro, simplesmente perfeito, do Arnaldo Jabor. Uma coletânea de crônicas, chamada "Amor é prosa. Sexo é poesia" com a qual muito me identifiquei. O Arnaldo conseguiu expor muito dos meus pensamentos ali no papel, isso tudo sem que eu sequer tivesse conhecido o Rio dos anos 60, e muito menos convivido com a Silvinha. E também nunca desejei ser ponta-esquerda de nenhum time de futebol durante a minha infância. Na verdade eu sequer gostava de futebol na minha infância! Percebia sua angústia ante o desenrolar do mundo e me encantava com o modo como a doçura e a amargura deram-se as mãos, caminhando juntas, a cada página lida.
Começo então a divagar em meus pensamentos, e sinto uma ponta de melancolia se esgueirando pelo muro, a fim de encontrar o portão aberto, e entrar, sem ser vista... E ela sempre consegue! Começo a pensar em tantos outros livros perfeitos que já li, e que, a cada página lida, assaltava-me o pensamento "tenho que passar este livro para o Cadmo", ou "Nossa! Isso é a cara da Luana!", pessoas com quem sinto vontade de compartilhar as idéias ali contidas, debater as questões suscitadas, e ter feéricos momentos, sempre ao som de Janis Joplin, e cercado de algumas garrafas de vinho. E percebo como faltam pessoas na minha vida! Sinto a vontade de conversar sobre o que está escrito, e bate-me um desejo insuportável de sentar numa mesa de bar com o autor ou autora, e dialogar sobre seus pensamentos. Assim, às vezes surge uma espécie de amor, de paixão, ou admiração por uma pessoa desconhecida, mas por quem, em dado momento, alimento o pensamento de que temos tantas afinidades... E que ele (ou ela) escreve tudo aquilo que eu gostaria de ter escrevido... Penso que seria muito bom podermos bater um papo algum dia...
De súbito, estou de volta à minha realidade, lamentando o aperto de mão, ou o abraço que não darei nos escritores e músicos (sim, eu beijaria o Beethoven! E talvez fumasse maconha com a Janis!) que sem sequer saber que eu existo, ajudaram a construir um pouco de mim!
Fecho o livro - não só o do Arnaldo - e pergunto-me com quem eu poderia conversar agora sobre ele... Com quem discutir o sexo dos anjos, e afirmar que a moral não tem nada de libertária? Com quem falar sobre Verões e Invernos desesperados? Com quem dizer que Deus é um terrorista? Minha irmã mais velha olhar-me-ia com o desdém de quem não tem muita paciência para questões sem qualquer finalidade prática e diria que tudo isso é uma chatice, uma chata e aborrecida forma de perder tempo sem chegar em lugar algum. Minha irmã do meio diria que estou afogando-me no pecado por tentar me liberar do cabresto que impuseram em mim quando mandaram um padre jogar um pouco de água sobre minha cabeça, dizendo algumas bobagens, enquanto um casal, que não eram meus pais, segurava-me no colo. Meu pai... Meu pai talvez, em sua eterna condescendência diria um grave e lento "Certo!" e daria por encerrada a conversa ali, sem contra-argumentar, e sem me mostrar o porquê de ele me achar certo... Frustrante! Este rei insuportável e arrogante que trago em minha barriga não toleraria tamanho desprezo, e me obrigaria a olhar estupefato para ele e me perguntar "Depois de todas as idéias brilhantes que expus, tudo o que me restou foi esse 'certo'?" E minha mãe... Esqueçamos minha mãe! Afinal, sou uma decepção!
Então, sento-me ao chão do quarto da minha avó e fico vendo Vídeo Show e novelas à tarde com ela, vez ou outra fazendo uma pergunta sobre algum dos personagens, a qual sei que ela não responderá por não ter me ouvido bem, dizendo qualquer outra coisa sobre qualquer outra personagem! Mas ela tem boa vontade. Até que me divirto com a TV e minha avó juntas no quarto! Por isso os finais de semana aqui são tão tediosos! Não tem Vídeo Show na Globo para ver!
Solidão dói! Isso não é novo, nem fui eu quem escreveu isso pela primeira vez! Duvido que serei o último a fazer essa observação! Ver os dias morosos levando o meu entusiasmo, sem ter um amigo para me abraçar, sem ter alguém deitado no meu peito enquanto tocam algumas notas em um violino de Bach, sem ter uma amiga para quem eu poderia ler algum soneto da Florbela, sendo mesmo obrigado a programar a contagem automática da máquina fotográfica para bater sozinho minhas próprias fotos, nas quais dou um sorrisinho amarelo tentando acreditar que pode parecer sincero se eu me esforçar bem! Tolice! Nada mais deprimente do que contagem automática de máquina fotográfica!
Resta-me o asilo do meu quarto, com todos os meus CD's a conversarem comigo, entendendo bastante a minha solidão, e com quem às vezes sou tão injusto quando os contemplo e penso "preciso de CD's novos". Assim vou existindo, vendo os dias e noites se arrastarem lentos, e paradoxalmente, levando muito rápido a minha vida embora! A vida tão curta que comecei a viver depois de tanto tempo apenas observando rosas nascerem e morrerem pela janela!

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